segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Dispa-se!

Estamos tão acostumados a nos vestir de super-heróis que às vezes esquecemos de voltar para nossas vestimentas originais.
Somos quem somos de verdade, somos também o que pensam de nós, somos o que acreditamos ser e às vezes somos aquilo que esperam da gente, e isso é um pouco confuso, tanto para ler, quanto para administrar no dia a dia.
Como chefes de uma família não podemos titubear, demonstrar fraquezas ou medos, pois se assim agirmos estaremos enfraquecendo as pessoas que conduzimos.
Como filhos, nunca devemos demonstrar sofrimento demais, pois isso arrebataria o coração dos nossos pais, que sofrem dobrado pelas nossas angústias.
Já como pais, devemos mostrar naturalidade diante dos percalços dos nossos pequenos, para incentivá-los a serem fortes e não se deixarem abater por pouco.
Diante da sociedade devemos parecer felizes e diante dos nossos pares nem tanto, a fim de que nos proporcionem mais afeto, mais colo.
E assim seguimos nossas vidas representando papéis, vivendo em várias peles, em vários mundos, em várias cores.
Acontece que não somos o que parecemos ser. Não somos o que os outros querem, não somos o que queremos e menos ainda o que acreditamos ser.
Nós somos a soma de tudo que vivemos e tudo que nos fizeram, e essa fórmula não está nos livros de química e nem em qualquer outro manual, essa fórmula é uma fórmula surpresa que um dia explode à nossa frente.
Sabe aquela apontada de dedo que alguém te mostrou olhando bem nos teus olhos? E que você jurou não ter te afetado. Pois é, afetou sim, e quando você menos esperar vai doer, e vai te incomodar como se tivesse acontecido horas atrás.
Aquela palavra áspera, a ausência da resposta que você tanto esperava, o abraço menos apertado que te deram, quando você esperava muito mais.
Tudo o que passamos se não foi bem resolvido vai voltar, e voltar de forma cruel, castigando pela demora, como se fosse um acréscimo de juros pelo tempo de espera.
Já vi homens fortes chorarem por tão pouco, coisas tão pequenas, e enfrentarem avalanches com o peito aberto.
Mulheres fortes e cheias de atitudes clamarem pelo único beijo que não lhe foi dado, o beijo de um pai, o abraço de um irmão.
Todas essas contas nos serão apresentadas, e no momento mais inoportuno possível, bem quando nossas janelas estiverem abertas, bem quando nossos telhados forem de vidro.
Não deixe amanhecer. Não deixe o dia passar, muito menos os anos, menos ainda uma vida inteira.
O grito que não sai da tua garganta pode te sufocar. Se não gostou, grite. Reclame proteste.
Se achou pouco o que lhe deram, peça mais, reivindique seus direitos, seus amores, seus abraços e até aquele tapa que no fundo você sabe que mereceu.
Não deixe a mágoa escurecer a sua visão do mundo, a sua visão sobre as pessoas.
É bem mais fácil perdoar as palavras que foram ditas aos gritos do que as que as abafadas pelo silêncio.
Deixe transparecer as tuas feridas, para que alguém possa vir e curá-las.
Não se faça de forte por muito tempo, isso é muito cansativo e só vai ferir a você mesmo.
Entre em repouso, respire e se deixe cuidar, se deixe parecer fraco, se deixe perder algumas coisas, às vezes é preciso perder.
Dispa-se das suas armaduras e coloque os teus pés no chão, olhe para você mesmo e se aproxime de quem você é de verdade.
Devemos ser mais o que somos e menos o que esperam de nós.


Angélica Marques

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